Os estudos sobre os efeitos da compressibilidade e da viscosidade do ar sobre um objeto em movimento surgiram, antes da década de 1940, da necessidade do entendimento de alguns dos fenômenos então observados nas aeronaves.
À medida em que os engenheiros aerodinâmicos projetavam aeronaves mais rápidas e que voavam mais alto, efeitos indesejados começaram a surgir em voo, e que afetavam o controle e a segurança das aeronaves. Àquela época, tais efeitos eram classificados como “flutter”, apesar de alguns cientistas já os associarem aos efeitos de compressibilidade do ar.

Flutter é uma vibração cíclica, de alta frequência, causada pela interação das forças aerodinâmicas e das forças elásticas que agem sobre as asas, ou sobre as superfícies de controle de uma aeronave.
Os efeitos indesejados surgiram a partir do momento em que as aeronaves atingiam velocidades cada vez mais próximas às do som, para a altitude em que se encontravam voando. Algumas delas experimentavam tais reações durante um rápido mergulho, ocasião em que aceleravam ainda mais. Porém, nos mesmos
mergulhos, quando a aeronave atingia altitudes inferiores, os fenômenos eram reduzidos ou até mesmo desapareciam, o que era difícil de ser compreendido. Tais efeitos, registrados àquela época, eram resumidamente os seguintes:
- Vibrações na cauda da aeronave, ou nas superfícies de comando de voo daquele setor, e que podiam espalhar-se por toda a aeronave.
- Subitamente e sem motivo aparente, o equilíbrio da aeronave se alterava, e a mesma apresentava uma tendência acentuada a picar (“nariz pesado”).
- O leme de direção e/ou o profundor perdiam efetividade, ou ficavam muito pesados para serem acionados mecanicamente.
Conhecer os efeitos da compressibilidade do ar e, em menor grau, os efeitos da sua viscosidade, são essenciais para o estudo da aerodinâmica de alta velocidade, onde a compressibilidade causa uma mudança na densidade do ar ao redor de uma aeronave.
Quando um objeto se move pela atmosfera, as moléculas de gás próximas ao objeto são perturbadas e se movem ao redor dele, e forças aerodinâmicas são geradas entre o gás e o objeto. A magnitude dessas forças depende da forma do objeto, da sua velocidade, da massa do gás que passa pelo objeto e de duas outras propriedades importantes do gás – a viscosidade e a sua compressibilidade (ou elasticidade).
Em relação à viscosidade observa-se que, quando um objeto se move por meio de um gás, as moléculas do gás aderem à superfície do objeto, formando uma fina camada de ar aderente à superfície – denominada “Camada Limite” (que pode ser laminar ou turbulenta, e normalmente não possui mais do que a espessura de uma folha de papel) que, com efeito, altera a forma do objeto.

O fluxo de ar reage à borda da camada limite como se essa fosse a superfície física do objeto, e a Camada Limite permite manter os filetes de ar escoando suavemente, acompanhando o perfil aerodinâmico do objeto em movimento. Entretanto, a camada limite pode se separar do corpo e criar uma forma diferente da forma física original, da superfície do objeto. Ainda, as condições de fluxo dentro e perto da camada limite são muitas vezes instáveis e se alteram com o tempo.
Podemos fazer uma analogia, para compreender como se forma a Camada Limite. Imagine um baralho de cartas, que é atirado sobre uma mesa. As primeiras cartas, em contato com o atrito da superfície da mesa, percorrem uma pequena distância e logo param. Isso ocorre somente com as primeiras cartas do baralho. As demais, acima das cartas iniciais, não “tocam” a mesa, e deslizam sobre as cartas abaixo delas, experimentando um atrito menor. Assim, as cartas superiores tendem a se deslocar a maiores distâncias, até finalmente pararem.
Em uma aeronave, a primeira camada de ar em contato com a superfície sofre grande influência do atrito gerado pela viscosidade do ar, enquanto que as demais camadas acima da superfície enfrentam somente o atrito da camada de ar imediatamente abaixo. A Camada Limite é então freada pela superfície da aeronave, e é empurrada pelo atrito causado pela camada de ar localizada logo acima, condição essa que gera turbulência.
A camada limite é muito importante para determinar o arrasto de um objeto, e também possui grande influência no fluxo de ar que passa acima de si, que gera sustentação em uma asa, por exemplo. Para determinar e prever essas condições, os engenheiros aerodinâmicos contam com o auxílio de testes em túnel de vento e de análises computacionais sofisticadas. Uma preocupação constante é manter a Camada Limite o mais “colada” à superfície dos aerofólios.
Um escoamento dito “laminar” ocorre quando as partículas de um fluido se movem ao longo de trajetórias bem definidas, apresentando lâminas ou camadas
(daí o nome laminar), cada uma delas preservando sua característica no meio. No escoamento laminar a viscosidade age no fluido, no sentido de amortecer a tendência de surgimento da turbulência. Esse escoamento ocorre geralmente em baixas velocidades e também em fluídos que apresentem grande viscosidade.

Já um escoamento dito “turbulento” ocorre quando as partículas de um fluido não se movem ao longo de trajetórias bem definidas, ou seja, as partículas descrevem trajetórias irregulares, com movimentos aleatórios, produzindo uma transferência de quantidade de movimento entre regiões de massa do fluido em movimento. Esse escoamento é comum na água, cuja viscosidade é relativamente baixa, mas também é observado no fluxo de ar ao longo de um objeto em movimento, a depender de sua forma e velocidade.

O parâmetro de similaridade importante para a viscosidade é o número (ou coeficiente) de Reynolds. Esse expressa a razão entre as forças inerciais (resistentes a mudanças ou movimento) e as forças viscosas (pesadas e colantes).
O número de Reynolds (abreviado como Re) é um número adimensional usado em mecânica dos fluídos, para o cálculo do regime de escoamento de determinado fluido, dentro de um tubo ou sobre uma superfície. É utilizado, por exemplo, em projetos de tubulações industriais e de asas de aviões. O seu nome vem de Osborne Reynolds, um físico e engenheiro irlandês que viveu no século XIX, e possui o significado físico de um quociente entre as forças de inércia e as forças de viscosidade de um determinado fluido.
A importância fundamental do número de Reynolds é a possibilidade de se avaliar a estabilidade do fluxo, podendo-se obter uma indicação se o escoamento flui de forma laminar ou turbulenta, e constitui a base do comportamento de sistemas reais, pelo uso de modelos reduzidos. Um exemplo comum é o túnel aerodinâmico, onde se medem forças dessa natureza em modelos de asas de aviões. Pode-se dizer que dois sistemas são dinamicamente semelhantes se o número de Reynolds for o mesmo para ambos.
Para aplicações em perfis aerodinâmicos, o número de Reynolds pode ser expresso em função da corda média aerodinâmica do perfil, da seguinte forma:

Onde: v representa a velocidade do escoamento, ρ é a densidade do ar, µ a viscosidade dinâmica do ar e c a corda média aerodinâmica do perfil.
A determinação do número de Reynolds representa um fator muito importante para a escolha e análise adequada das características aerodinâmicas de um perfil aerodinâmico, pois a eficiência de um perfil em gerar sustentação e arrasto está intimamente relacionada ao número de Reynolds obtido. Geralmente, no estudo do escoamento sobre asas de aviões, o fluxo se torna turbulento para números de Reynolds da ordem de 1×107, sendo que abaixo desse valor geralmente o fluxo é laminar.
Se o número de Reynolds do experimento e do voo estiverem próximos, os efeitos das forças viscosas em relação às forças inerciais serão modelados adequadamente. Caso contrário, a física do problema real não será modelada de maneira apropriada, e serão previstos níveis incorretos das forças aerodinâmicas.
Você já deve estar percebendo que as forças aerodinâmicas se relacionam com algumas características do ar de uma maneira complexa, e outra característica essencial para o entendimento da aerodinâmica é a compressibilidade do ar.
Como afirmamos, quando um objeto se move por meio de um gás, as moléculas de gás se movem ao redor do objeto. Se um objeto se desloca em baixa velocidade pela atmosfera, as pressões geradas sobre o corpo são baixas e a densidade do gás permanece praticamente constante.
Entretanto, para elevadas velocidades, parte da energia do objeto é comprimida e muda a densidade do gás (pois a mesma massa de ar agora ocupa um volume diferente), o que altera a quantidade de força resultante sobre o objeto. Uma vez próximo ou além da velocidade do som, são produzidas ondas de choque (trataremos deste assunto mais adiante), que afetam a sustentação e o arrasto do objeto. Da mesma forma, os engenheiros aerodinâmicos contam com testes de túnel de vento e análises computacionais para prever essas condições.
