Efeitos aeroelásticos

A Aeroelasticidade é o estudo do efeito das forças aerodinâmicas em corpos elásticos. A teoria clássica da elasticidade lida com a tensão e a deformação de um corpo elástico, no qual incidem forças externas ou deslocamentos, e a estabilidade de uma estrutura exposta a um fluxo de ar é um dos problemas mais interessantes de se analisar em aeroelasticidade.

As forças aerodinâmicas, para uma dada configuração de um corpo elástico, crescem significativamente com a velocidade do fluxo do ar. Logo, pode haver uma velocidade crítica que torna a estrutura instável, e tal instabilidade pode causar deformações excessivas e até levar à destruição da estrutura, comprometendo a segurança do voo.

A figura a seguir apresenta o esquema de um acidente envolvendo um avião Beech 1900C em 28 de dezembro de 1991. A Agência Nacional de Segurança nos Transportes dos Estados Unidos (NTSB) investigou o acidente e determinou como sua possível causa a perda de consciência da altitude e desorientação espacial
do piloto instrutor, mas uma investigação independente, feita pela Associação de Pilotos de Linhas Aéreas (ALPA), concluiu que o motor direito se separou da asa
e colidiu no estabilizador horizontal, causando a perda catastrófica do controle da aeronave durante o voo.

Ainda de acordo com Serrano, 2010, segundo a investigação da ALPA, o rompimento de um suporte do motor direito foi causado por um fenômeno de whirl-flutter (instabilidade dinâmica sujeita a ocorrer sob certas condições na nacele de um motor com hélices – envolve uma instabilidade aeroelástica que pode ocorrer quando a força de conexão da nacele do motor, incluindo a hélice, não é suficientemente grande).

Os efeitos aeroelásticos mais importantes são o Flutter, a Divergência e a Inversão dos ailerons.

O efeito flutter, ou também chamado de ressonância aeroelástica, é uma das representações dos efeitos vibratórios da ressonância, fenômeno em que os materiais vibram na frequência natural do material em questão. A frequência natural de cada objeto é determinada por sua massa e rigidez, e quando a massa do objeto é aumentada faz com que a frequência natural diminua. Caso a rigidez do material seja aumentada, aumenta-se a frequência natural. Isso pode ser observado ao aumentar-se a tração de uma corda de violão, fazendo com que ela vibre em uma frequência maior e produza sons mais agudos (Flutter, o efeito quebra asas).

O fenômeno Flutter é então uma combinação de efeitos elásticos, inerciais e aerodinâmicos, provocado por uma oscilação instável autoexcitada de um aerofólio e sua estrutura associada. Os componentes estruturais envolvidos no fenômeno vibram na frequência natural quando sobre eles agem forças aerodinâmicas.

Nas aeronaves, existe uma velocidade em que o efeito ocorre, a qual é denominada de “velocidade crítica de flutter”. A amplitude de uma oscilação causada por um distúrbio qualquer é mantida a valor constante, porém, ao aumentar a velocidade, essa amplitude aumentará até que a estrutura não suporte e ocorra uma ruptura do material.

O modo de impedir esse colapso da estrutura é obtido pelo amortecimento dinâmico das vibrações harmônicas, isso contribui para que não se atinja a ressonância natural da estrutura. Alguns tipos de amortecimento estão presentes nas aeronaves, normalmente amortecimentos estruturais resultantes do uso de materiais compostos ou amortecimentos aerodinâmicos.

Os voos de ensaio para garantia de inexistência de flutter (quando empregados) são feitos a grande altura, por pilotos experientes e conhecedores do fenômeno,
equipados com paraquedas.

Na concepção de uma nova aeronave, a aeroelasticidade desempenha um papel significativo. A introdução de asas mais finas, de superfícies estabilizadoras horizontal e vertical, de configurações de cauda em “T”, entre outras, aumenta a probabilidade do fenômeno de flutter dentro do envelope de voo desejado. Hoje, os projetos de aeronaves envolvem análises sofisticadas para garantir que estão livres de flutter. Esses resultados analíticos muitas vezes são verificados por testes em túnel-de-vento e testes de vibração em solo. Testes em voo do flutter fornecem a verificação final das previsões analíticas.

Serrano, 2010, também destaca a existência de outra forma de Flutter, o denominado flutter de estol. Igual ao flutter clássico, porém, leva em consideração os efeitos do descolamento da camada limite, já que ocorre em uma superfície de sustentação quando essa opera com elevados ângulos de ataque no escoamento, durante ao menos parte de cada ciclo de oscilação. Quanto à Divergência, segundo Serrano, 2010, autores a definem como uma instabilidade estática da superfície de sustentação de uma aeronave em voo, ou seja, como uma instabilidade aeroelástica de frequência nula. Ocorre quando a superfície sustentadora da aeronave sofre deflexão devido ao carregamento aerodinâmico, aumentando a carga sobre o perfil. Se essa carga sobrepassa a carga limite, a estrutura da aeronave pode falhar.

O terceiro principal fenômeno da aeroelasticidade é abordado por Saintive, 2009, da seguinte maneira. À medida que aumenta a velocidade do avião, eleva-se também a pressão dinâmica do ar. Entretanto, como a resistência da asa não varia, isso acarreta uma torção na asa. Assim, a rotação da asa produzida pelo torque diminui a eficiência dos ailerons, até o momento em que ele perde totalmente o efeito, na chamada “velocidade de inversão de ailerons”. Duas são as possíveis soluções para esse problema: uma é dotar a asa de uma estrutura suficientemente forte (o que pode ser caro ou inconveniente, por uma questão de peso), e outra é o emprego de dois pares de ailerons, um externo e outro interno. Assim, os ailerons críticos (que são os externos)são utilizados somente em baixas velocidades. Serrano, 2010, também aborda a questão da Inversão dos ailerons. Segundo o autor, as deformações elásticas dos componentes onde se montam as superfícies de controle podem diminuir a eficiência dos controles, levando até à reversão deles. Nessa reversão, a aeronave responde ao contrário do que o piloto deseja. Um exemplo claro acontece com os ailerons, que são dispostos próximos à ponta da asa, para que o momento de rolamento seja mais eficiente.

Nessa região da asa, a rigidez à torção é menor do que na raiz; com isso, em altas velocidades, uma deflexão no aileron pode gerar uma força tão grande a ponto de torcer toda a ponta da asa. Essa torção altera o ângulo de ataque no sentido de diminuir o rolamento na asa. Dependendo da intensidade da torção, o controle pode perder eficiência e até reverter-se.

Para melhorar a eficiência do comando lateral são empregados os Spoilers. Tais superfícies “destroem” a sustentação, baixando a asa correspondente e causando um rolamento. Em voo, essas superfícies também podem ser utilizadas como freios, quando são levantados em pares, e recebem o nome de Speed Brakes. Os Spoilers também são utilizados no solo, sendo elementos muito importantes na redução da corrida de aterragem (ground spoilers).

De acordo com Serrano, 2010, um outro efeito aeroelástico é o Buffeting. Você deve se recordar que, na Seção 3, quando falamos sobre o descolamento da camada limite em aerofólios, abordamos o conceito das vibrações denominadas Buffeting. Pois bem, Serrano 2010 explica que o Buffeting também é caracterizado como um efeito aeroelástico, sendo uma resposta estrutural à excitação produzida pelo choque induzido por separação do escoamento, ou seja, a separação causada por movimentos turbulentos das camadas de ar em torno da própria aeronave. O Buffeting pode aparecer durante manobras em velocidade de cruzeiro e afetar diferentes partes da aeronave, sendo o mais importante aquele que se manifesta nas asas. Dependendo do ângulo de ataque, o fluxo pode conter separações, que constituem excitações aerodinâmicas com potencial risco à estabilidade do voo.

Para concluir, o problema central em aeroelasticidade é o efeito da deformação elástica na distribuição da sustentação do avião. Em baixas velocidades, o efeito das deformações elásticas é pequeno, porém, em altas velocidades pode se tornar muito sério, levando à instabilidade da asa e à perda da efetividade de superfícies de controle, ou mesmo sua reversão.

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