Número Mach e impulsos de pressão

Os efeitos da compressibilidade do ar sobre um corpo dependem, basicamente, da relação entre a velocidade do corpo em movimento na atmosfera e a velocidade do som para uma mesma temperatura.

É sabido que a propagação sonora ocorre por meio de movimentos ondulatórios que se deslocam em todas as direções a partir de um emissor, e que a velocidade
do seu deslocamento varia em função do meio em que propaga, sendo diretamente proporcional à densidade desse meio.

Lembre-se de que o som viaja em diferentes velocidades e em diferentes meios (por exemplo, no ar e na água, ou por um condutor metálico). Na atmosfera, a variação da velocidade do som em função da densidade do ar pode ser considerada desprezível. Entretanto, não podemos desprezar uma outra propriedade do ar, que tem grande influência na velocidade do som. A temperatura.

Para que um movimento sonoro ondulatório possa viajar ao longo da atmosfera, é preciso que cada molécula do ar transmita tais impulsos à molécula adjacente.
Uma vez que o calor de um corpo é proporcional à agitação de suas moléculas, sabe-se que quanto mais aquecido se encontrar um corpo, mais agitadas estarão as suas moléculas e, por conseguinte, maior facilidade este terá de transmitir os movimentos ondulatórios.

Hoje sabemos que a temperatura do ar modifica o modo como o som se propaga, e isso ocorre de maneira diretamente proporcional. Ou seja, quanto maior a temperatura do meio de transmissão, maior será a velocidade de propagação do som. Assim, teremos diferentes velocidades de propagação do som ao longo das camadas da atmosfera, a depender da sua temperatura.

Em 1635, Pierre Gassendi mediu a velocidade do som observando o funcionamento dos canhões. Ao comparar o tempo entre o clarão do disparo e o barulho do canhão, ele obteve o valor de 478 m/s.. Mais tarde, uma equipe da Academia de Ciências Parisiense chegou ao resultado mais preciso de 344 m/s a 20° C. Dessa forma, os cientistas descobriram que a velocidade do som (V), sob condições normais de pressão, pode ser calculada pela fórmula:

  • Vo é a velocidade do som a 0° (331,45 m/s);
  • T é a temperatura Kelvin do ambiente, ou seja, a temperatura em Graus Celsius acrescida de 273,15; e
  • T0 é o valor correspondente a 0° C em escala absoluta, ou seja, 273,15 K

Perceba, então, que a velocidade do som na atmosfera possui relação direta apenas com a temperatura do ar. Ou seja, se eventualmente transitássemos em diferentes altitudes onde a temperatura do ar fosse constante (na estratosfera, por exemplo), a velocidade do som não se alteraria.

Devemos observar que os efeitos de compressibilidade do ar sobre uma aeronave não ocorrem somente quando o objeto se desloca na velocidade do som ou acima dela. Considerando a aerodinâmica básica, a sustentação gerada por um aerofólio é fruto da diferença de velocidades entre o fluxo de ar no seu extradorso e no seu intradorso, que gera diferenciais de pressão e forças resultam dessa diferença de pressão.

Assim, no extradorso de uma asa, por exemplo, sabemos que o ar é propositadamente acelerado e, então, novamente desacelerado. Dependendo da forma do objeto, do seu material, da temperatura do ar e de outros fatores. Poderá ocorrer que, em algum momento, mesmo que o avião esteja voando abaixo da velocidade do som, regiões do extradorso da asa poderão apresentar fluxo de ar supersônico (acima da velocidade do som), e responder às leis que regem tais escoamentos mais velozes.

Assim, ao acelerarmos uma aeronave, poderemos alcançar um valor de velocidade para a qual, pela primeira vez, em uma determinada região da aeronave (normalmente a asa, próximo à fuselagem – local onde a curvatura da asa é maior, e, consequentemente, onde o ar é mais acelerado), o deslocamento do ar atinge a velocidade do som. Essa velocidade na qual o avião se encontra é denominada de Número Mach Crítico.

O parâmetro de similaridade importante para o efeito de compressibilidade do ar atmosférico é o Número Mach – M, que é definido pela razão entre a velocidade aerodinâmica do objeto V e a velocidade do som a.

Os atuais aviões de carreira costumam voar em cruzeiro em altitudes próximas a 35.000 ft / 40.000 ft (alguns jatos executivos podem alcançar até 51.000 ft), a uma velocidade de cerca de M 0.75 / M 0.85. Isso quer dizer que, para uma determinada altitude (na verdade, uma determinada temperatura), essas aeronaves empregam velocidades de 75% a 85% da velocidade do som, para uma mesma temperatura do ar.

O número Mach aparece como um parâmetro de escala em muitas das equações para fluxos compressíveis, ondas de choque e expansões. Em testes de túnel de vento, é necessário coincidir o número Mach entre o experimento e as condições que serão encontradas em voo. Assim, é incorreto medir um coeficiente de arrasto a alguma velocidade baixa (digamos 200 mph) e aplicar esse coeficiente de arrasto a um regime de voo do dobro da velocidade do som (aproximadamente 1400 mph, Mach = 2.0). A compressibilidade do ar impõe significativas alterações no comportamento físico do ar, na comparação entre esses dois casos.

Como sabemos da física, o som viaja pelas ondas, usando um meio de propagação (como a atmosfera). Essas ondas, denominadas ondas de pressão, desenvolvem-se de maneira similar a quando jogamos uma pedra sobre um lago. Uma onda circular se forma no ponto em que a pedra atinge o lago e se afasta, expandindo-se a uma
velocidade constante. A pedra provocará um movimento ondulatório, que tenderá a se afastar do ponto onde caiu com velocidade constante, em todas as direções.

Se atirarmos várias pedras no mesmo ponto em intervalos iguais, formaremos várias ondas (impulsos) concêntricas, partindo de um mesmo ponto, que se afastarão com velocidades constantes e com distâncias igualmente constantes entre si.

Isso também ocorre com um emissor sonoro como o avião, que produz as mais variadas vibrações, essas se manifestam em vários impulsos de ar (ondas de pressão), gerados ao longo de sua estrutura física (asas, fuselagem etc.). Entretanto, diferentemente das pedras atiradas ao lago, um objeto se deslocando no ar está em movimento. Igualmente com o que ocorre ao comprimirmos uma mola em intervalos regulares, essa se comprime e estica alternadamente, os impulsos gerados a partir de um avião em movimento na atmosfera provocam a compressão e a rarefação do ar.

Ao deslocar-se abaixo da velocidade do som (ou seja, abaixo da velocidade das próprias ondas que ele está produzindo), a distância entre tais ondas será menor no sentido do deslocamento do corpo, em relação aos demais sentidos (devido ao movimento relativo do ponto emissor), como exemplificado na figura abaixo.

Tais ondas propagam-se no ar em uma determinada velocidade, a qual já vimos que é denominada como “velocidade do som”, que ao nível do mar em condições de atmosfera padrão (15 graus Celsius) é de 1226 km/h (340,5 m/s) e diminui com a redução da temperatura do ar. Ficou convencionado que, quando um avião se desloca com uma velocidade igual à do som, ele está voando a Mach 1. Esta unidade é uma homenagem ao físico austríaco Ernst Mach.

Então, recapitulando, quando um objeto qualquer se desloca na atmosfera, comprime o ar à sua volta, principalmente à sua frente. Dessa forma, cria ondas de pressão (impulsos de pressão), de maneira similar às pedras atiradas no lago, mas com a diferença de que o emissor das ondas também está em movimento, em um eterminado sentido.

Observe a imagem abaixo:

  • 1 – Objeto se deslocando com velocidade subsônica
  • 2 – Objeto se deslocando com velocidade Mach 1
  • 3 – Objeto se deslocando com velocidade supersônica
  • 4 – Ondas de Choque

Uma aeronave deslocando-se a uma velocidade inferior à do som produzirá impulsos de pressão que viajam mais rápido que o próprio corpo emissor, espalhando-se para todos os lados, inclusive à frente do avião. Assim, nessa condição, o som viaja à frente do objeto em movimento e influencia o ar à frente da aeronave, como que se o estivesse “alertando” para o que ocorrerá logo em seguida. Esse alerta produz a inclinação dos filetes de ar próximos ao bordo de ataque do objeto, “moldando-os” à sua forma. Esse fenômeno é definido como “Upwash”. É o que ocorre no item 1 da imagem anterior.

Da mesma forma, no mesmo escoamento subsônico comentado anteriormente, os filetes de ar que “abandonam” a aeronave pelo bordo de fuga devem ser desacelerados, para que tenham ao final a mesma velocidade dos filetes à frente da aeronave, ou seja, a velocidade da própria aeronave. Ao abandonarem o bordo de fuga, “retornam” à inclinação anterior em um fenômeno denominado “Downwash”.

Entretanto, se o avião acelerar para uma velocidade igual à do som (Mach 1), ou seja, acelerar até a velocidade de deslocamento de suas próprias ondas de pressão, estará comprimindo o ar à sua frente e acompanhando as suas próprias ondas de pressão com a mesma velocidade de sua propagação. Isso resultará no acúmulo de ondas no nariz do avião. Se o avião persistir com essa velocidade por algum tempo, à sua frente se formará uma espécie de “muralha” de ar, pois todas as ondas formadas ainda continuariam no mesmo lugar em relação ao avião. Esse fenômeno é conhecido como Barreira Sônica.

Então, se a velocidade do emissor for igual à velocidade de propagação das suas ondas de pressão, a velocidade resultante do movimento relativo dos dois será nula. Teremos então, o ponto emissor junto ao movimento ondulatório, acompanhando o deslocamento das ondas, e isso gera um acúmulo de ondas junto ao corpo, ou seja, uma zona de compressão denominada Onda de Choque Normal, pois é perpendicular ao deslocamento do emissor.

Consideremos que o avião continue a acelerar e ultrapasse a velocidade do som. Nesse caso, ele deixará para trás as próprias ondas de pressão que estará produzindo, como ilustrado na figura a seguir, e surgirá uma Onda de Choque Oblíqua e à frente do deslocamento do avião, que se chama “Cone de Mach”. Quanto maior a velocidade da aeronave, acima da velocidade do som, menor será o “Ângulo de Mach”

Um avião só pode atingir velocidades supersônicas se, entre outras coisas, a sua aceleração permitir uma passagem rápida pela velocidade de Mach 1, evitando a formação da Barreira Sônica

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