Performance de Decolagem de Aeronaves parte 2

Distância de Decolagem:

Os requisitos são determinados com base no princípio de que a aeronave é acelerada para a VEF, momento em que o motor crítico se torna inoperante e permanece inoperante pelo resto da decolagem, e de que a velocidade de segurança de decolagem V2 é atingida antes da aeronave atingir 35 pés de altura. Os segmentos seguintes de voo se iniciam no final da Distância de Decolagem (TOD), na altura de 35 pés.

Bem, uma vez apresentado às diversas velocidades empregadas em aviação, que caracterizam o perfil de uma decolagem (no sentido amplo, com seus cinco segmentos), vamos relembrar e aprofundar outros vocábulos que também são imprescindíveis para se planejar uma decolagem, referentes ao comprimento de uma pista de decolagem e pouso. Veremos que uma pista pode ter um comprimento disponível para decolagem até maior do que para o pouso.

Você já deve ter ouvido falar que uma pista de decolagem e de pouso não é composta somente pelo seu segmento asfaltado ou de concreto. Essa afirmação é verdadeira por algumas razões. Em tese, analisando-se somente a questão do comprimento de uma pista (sem levarmos em conta a possibilidade de existência de obstáculos após a decolagem, ou a altitude do campo), podemos afirmar que uma aeronave que decola de uma pista com maior comprimento poderá levar mais carga do que outra que decola de uma pista menor, nas mesmas condições. O mesmo pensamento é válido para o pouso.

Você compreenderá mais adiante que essa afirmativa é parcialmente correta, sendo válida somente quando o peso de decolagem for limitado pelo comprimento da pista. A partir de um dado comprimento de pista, dependendo de qual fator limitante de decolagem seja mais restritivo (por exemplo, se o peso for limitado pela capacidade dos freios, pelo desempenho dos pneus, pelo desempenho de subida nos segmentos de subida, ou pela existência de obstáculos), de nada adiantará estender a pista de decolagem após um certo comprimento. Mesmo com uma pista considerada “infinita”, o peso de decolagem continuaria sendo limitado por outros fatores.

Bem, é possível compreender que nem sempre é possível “construir” uma pista com o tamanho necessário para a operação de todas as categorias de aeronaves, seja por questões de custo ou mesmo por quesitos técnicos ou de espaço físico. Assim, para “estender” o comprimento de uma pista, utilizam-se dois artifícios: a construção das chamadas “Stopway” e “Clearway”, largamente empregadas na maioria das pistas dos aeroportos. Vejamos do que se tratam:

STOPWAY

A STOPWAY nada mais é do que uma área além do final da pista, com as seguintes características:

  • Deve ser tão larga quanto a pista;
  • É centrada em torno da linha central estendida da pista;
  • Deve ser capaz de suportar o peso do avião, sem causar danos estruturais a ele;
  • É designada pelas autoridades aeroportuárias para uso na desaceleração do avião, apenas durante uma rejeição de decolagem (abortiva) – RTO “Rejected Takeoff”.

Ou seja, a Stopway não precisa ser construída com o mesmo material da pista, desde que suporte o peso da aeronave sem causar danos a ela. Importante observar que o trecho da Stopway não pode ser utilizado pelo piloto como parâmetro para efeitos de decolagem ou de pouso, nos seguintes sentidos – a aeronave não pode usar a Stopway como um acréscimo no comprimento da pista destinado a acelerar e decolar, tampouco para desacelerar após o pouso, mas somente para desaceleração em caso de uma rejeição de decolagem.

CLEARWAY:

A CLEARWAY é uma área além dos limites da pista, com as seguintes características:

  • Possui uma largura mínima de 500 pés (152,4 m);
  • Localizada em torno da linha central estendida da pista;
  • Seu comprimento deve ser inferior à metade do comprimento da pista;
  • Sua área deve estar sob o controle das autoridades aeroportuárias;
  • Em sua área não pode haver nenhum obstáculo sobressaindo acima de 1,25% do plano de rampa, exceto as luzes de cabeceira localizadas nos lados da pista (desde que não excedam 26 polegadas / 66 cm acima do final da pista e que sejam colocadas nas suas laterais).

Os cálculos de peso máximo de decolagem permitem que a aeronave atinja uma posição de altura de 35 pés sobre a área da Clearway, desde que ao menos metade da distância entre o despegue (VLOF) e o atingimento da V2 sejam realizados sobre a pista, conforme representado na figura a seguir.

As imagens abaixo mostram o posicionamento de Clearway e Stopway em duas diferentes pistas. Em ambos os casos, a Stopway encontra-se inserida nos limites
da Clearway.

Os conceitos de Stopway e Clearway são importantes para a compreensão de alguns termos padronizados e empregados na aviação, para caracterizar diferentes comprimentos de pista – as chamadas “Distâncias Declaradas”. As cartas aeronáuticas que tratam da questão do comprimento de uma pista utilizam tais abreviaturas. A figura a seguir resume tal questão.

De forma resumida, temos que:
LDA – Landing Distance Available – é o comprimento da pista disponível para o pouso. Repare que, na figura anterior, a LDA é menor que o comprimento da pista,
haja vista que um trecho da cabeceira 09 está deslocado (possivelmente por conta da existência de obstáculos no eixo da aproximação final daquela cabeceira).

TORA – Take-off Run Available – comprimento declarado da pista, disponível para corrida no solo de uma aeronave que decola. Não inclui a Stopway.

ASDA – Accelerate and Stop Distance – é o comprimento disponível para a aceleração da aeronave e para a execução de uma abortiva, se necessário. É o somatório da TORA com a Stopway (quando esta existir).

TODA – Takeoff Distance Available – é o comprimento disponível para a aceleração da aeronave e para o prosseguimento da decolagem, em caso de uma falha
durante a rolagem. É o somatório da TORA com a Clearway (quando esta existir).

Primeiro Segmento:

É a fase temporal desde a VLOF até o ponto onde o trem de pouso é totalmente retraído. O Gradiente bruto necessário de subida deve ser positivo em todos os
momentos, para aeronaves de dois motores, não inferior a 0,3% para aeronaves de três motores, e não inferior a 0,5% para aeronaves de quatro motores.

Segundo Segmento:

Esse segmento começa quando o trem de pouso é totalmente recolhido e pode estender-se a qualquer ponto em que a aeronave nivele para iniciar uma aceleração
(para recolhimento dos Flapes, sempre acima da altura mínima de 400 pés – esta altura de nivelamento pode ser maior, a depender da necessidade de livrar obstáculos no perfil da subida). O Segundo Segmento termina quando a aeronave atinge a altura planejada para o início da aceleração para recolhimento dos dispositivos hipersustentadores, ainda mantendo-se a potência de decolagem nos motores remanescentes. A redução da potência ocorrerá ao longo ou ao final do Terceiro Segmento, como será visto a seguir.

O segmento é realizado com a configuração de trem de pouso recolhido e Flapes na posição de decolagem. Além disso, nenhuma mudança de potência pode ser feita pelo piloto, até que a aeronave atinja ao menos 400 pés acima da superfície da pista. Os gradientes de subida bruta exigidos devem garantir ao menos 2,4% para aeronaves bimotoras, 2,7% para aeronaves trimotoras e 3,0% para aeronaves quadrimotoras. Durante esse segmento, a aeronave deve manter a velocidade o mais próximo possível da V2.

Esta é uma das fases que mais impõem limites ao peso de decolagem de uma aeronave. A depender, principalmente, da altitude do campo, da temperatura e da seleção de Flapes de decolagem, os critérios de subida no Segundo Segmento podem restringir seriamente o limite de peso de decolagem de uma aeronave.

Tomemos como exemplo a pista de decolagem do Aeroporto Internacional de Brasília, DF. Apesar de suas pistas de decolagem possuírem grande extensão, o fato de o aeródromo encontrar-se localizado a 3.500 pés de altitude causa impactos na limitação do peso de decolagem das aeronaves que por lá operam, haja vista a exigência de se manter um gradiente mínimo de subida no Segundo Segmento.

Terceiro Segmento:

Também conhecido como Segmento de Aceleração, é o primeiro dos segmentos «opcionais». Pode ser usado quando os obstáculos permitem à aeronave voar em atitude nivelada, para possibilitar a sua aceleração. Durante esse segmento, a aeronave é acelerada até a Velocidade Mínima de Recolhimento dos Flapes (VFR) – ou mais de uma VFR – o recolhimento pode ser sequencial, ou seja, a depender da configuração de Flapes empregada na decolagem, cada recolhimento deverá obedecer a um limite de velocidade específico.

Recolhidos os Flapes e quaisquer outros dispositivos hipersustentadores, a aeronave é considerada como “limpa” e a sua subida pode ser retomada ao atingir a Velocidade do Segmento Final de Subida (VFS). Uma vez “limpa” e atingida e mantida a VFS, a potência dos motores remanescentes pode então ser reduzida para o regime “Máximo Contínuo” (o qual será mantido até a altitude final de nivelamento, a critério dos pilotos). Teoricamente, os cálculos de decolagem incluem a manutenção dos motores remanescentes em potência de decolagem, até que a aeronave seja “limpa” e acelerada para a VFS; entretanto, caso o limite de tempo estipulado para os motores operarem em potência de decolagem seja atingido antes do fim dessas duas operações, a redução para a potência de “Máximo Contínuo” poderá ser antecipada, com a aeronave nivelada no Terceiro Segmento. O Terceiro Segmento não pode ser iniciado a uma altura inferior a 400 pés acima da superfície de decolagem.

Quarto Segmento:

Também chamado de Segmento de Subida Final de Decolagem, compreende o segmento existente a partir da altura de aceleração escolhida, até uma altitude de ao menos 1500 pés. Os gradientes brutos de subida para este segmento não podem ser inferiores a 1,2% para aeronaves bimotoras, 1,5% para aeronaves trimotoras e 1,7% para aeronaves quadrimotoras, voados a uma velocidade não inferior a 1,25 Vs.

No Quarto Segmento, os gradientes de subida mínimos consideram que os motores em operação restantes não mais utilizam o regime de potência máxima de decolagem, mas sim o de potência “Máxima Contínua”.

Existem duas formas de se calcular os limitantes de peso de uma aeronave, sejam eles de decolagem, subida, cruzeiro, descida ou pouso. Suponhamos o caso de
uma decolagem, apenas no tocante aos aspectos de limite dos freios, dos pneus e do comprimento da pista em si.

Se o piloto pretende decolar com um determinado peso, entrará com esse valor nos gráficos de desempenho ou software disponibilizados pelo fabricante (juntamente com outras variáveis como temperatura, altitude, ajuste de altímetro, gradiente da pista, tipo de pavimento, direção e intensidade do vento etc.) e descobrirá o comprimento de pista mínimo para que a decolagem naquelas condições seja realizada (os gráficos disponíveis devem refletir os requisitos de certificação). Ao obter o resultado do comprimento mínimo necessário, o piloto deverá comparar esse valor com o comprimento de pista realmente disponível, para saber se é ou não possível decolar com aquele peso.

Um outro método, também disponibilizado nos gráficos e, principalmente, nos softwares, utiliza o pensamento inverso. Ou seja, inserem-se os dados da pista a ser utilizada (os mesmos relatados anteriormente, inclusive a existência ou não de clearway e stopway), e os gráficos ou o software informam qual o maior peso de decolagem disponível para aquela situação.

Assim, se o peso desejado para a decolagem for inferior ao limitante encontrado, o piloto poderá prosseguir com suas intenções para a fase de decolagem sobre a
pista (o piloto deverá gerar outras análises, para as demais fases do segmento de decolagem, e também do voo como um todo – subida após a decolagem, subida em
rota, cruzeiro, descida, arremetida e pouso – como veremos ao longo do capítulo).

Ao todo, na fase de análise da performance de decolagem, os gráficos ou o software irão comparar 7 (sete) fatores limitantes (Limitante pela Pista, Limitante por Freios, Limitante por Pneus, Limitante por V1 Mínima; Limitante por Trajetória de Decolagem (os quatro segmentos apresentados anteriormente), Limitante por Obstáculos e Limitante por tempo de uso da Potência Máxima de Decolagem (5 min ou 10 min no máximo). O peso máximo disponível para a decolagem deverá ser o MENOR dos sete – ou seja, o mais restritivo (ainda sem levar em conta as demais fases do voo, logicamente, que poderão implicar em reduções ainda maiores no peso de decolagem).

Agora que já recordamos ou aprendemos conceitos importantes, e compreendemos como se forma o perfil de uma decolagem em seu sentido mais amplo, vamos
abordar um pouco mais sobre os fatores limitantes de peso para uma decolagem.

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